Presunção da inocência em 24 quadros por segundo

04/10/2012 Colunas - Sonhos Viciados

Tem alguém do outro lado. Tem gente por todos os lados. Estou sendo vigiado, instalaram novas câmeras. (E ainda me sinto sozinho.)

A priori todo mundo é inocente. Artigo 5º inciso LVII. Indiferentes na nossa medida, até onde alcança nossa percepção de bondade.

Somos todos suspeitos, culpados de um crime ainda não cometido. Botaram uma câmera no meu trabalho. Quem não deve não teme. Teme o inferno, comungue e seja um bom filho. Ande na linha, meu rapaz.

Não saber quem criou a linha incomoda. Mas agora temos câmeras e todos tem cara, RG, CPF e boa conduta, não?

Não vá fazer nenhuma besteira, agora onipresente e onipotente tem concorrência. A mãozinha dos homens. Pouca coisa mudou.

De grão em grão ficamos no papo, no papo de quem não conheço, de quem acha melhor manter todos na linha. É mais barato, causa menos intrigas e reduz encargos jurídicos, administrativos e encheção de saco.

A tecnologia é mesmo fascinante, os tempos mudaram, mas será que perdemos o jeito. Afundamos num emaranhado de fibras-ótica e desaprendemos.

Desaprendemos, na era da informação.

Tratar todos como meliantes é constitucional? Precisamos ser vigiados para ficar na linha? Quem não deve não teme, comungue e seja um bom filho.

Todas as noites cairemos no descanso, triste demais, querendo ir pra longe sem saber pra onde. Com o sentimento de que não é daqui e nem de nenhum lugar. Estrangeiro em casa, não pode fumar, fazer barulho. Já passou das dez.

Aqui não da mais, mas onde dará? Tem câmeras no céu e no inferno. Quem não deve não teme, comungue e seja um bom filho.

Um cara entre vielas cheias de gente e ônibus lotado. Que se perde em alguns bares e se põe a ver a velocidade dessa gente. E rir da estupidez dessa lógica.

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