Livros, discos e poeira no armário

13/06/2011 Colunas - Sonhos Viciados

As vezes é preciso ver de novo. As vezes é preciso ver mil vezes e tem as tantas outras vezes que é melhor nem ver. Coleciono discos na estante, cada temporada é um novo. Depois cansa, como tanta gente que passa nas nossas vidas, depois cansa.

Daí deixo eles descansarem na estante, ao lado dos livros que veem junto das temporadas. Reparou? A vida é cheia de temporadas, das fases e dos altos e baixos. Se sacar tem trilha sonora pra mocinha da viela, tem poema pras Anas e Lucimaras, tem discos e discos que são recheados das palavras desses livros e neles os dias que a gente vai levando.

Quase sempre a gente ouve as músicas até rachar, looping eterno pros refrões e muito fôlego, pra rima não ficar sem graça e os versos repetidos.

Depois, a gente cansa. E eles descansam ao lado dos livros.

Quase sempre minha estante fica repleta de poeira, porque a vida corre rápido e a gente não tem tempo pra isso, pra lustra móveis, pra Poliflor com cheirinho de Lavanda. Mas não tem jeito, tem vezes que é preciso voltar lá e por tudo em ordem. Os discos voltam pro tocador, os livros voltam a ser lidos e reviver as temporadas é efeito colateral que atinge o estômago sem nenhum rancor. Solto o riso, lembro das Anas e das Lucimaras e é isso.

No fim nunca gosto disso, de reler os livros e nem de ouvir os velhos discos. No fim é reviver de forma intensa demais coisa que não faz mais sentido. Fico feliz de ter uma trilha sonora pra mocinha da viela, mas me dá ânsia quase que sentir nos pés o frio daqueles paralelepípedos.

No fim a vida corre demais e a gente não tem tempo, pra Poliflor cheirinho de lavanda.

Um cara entre vielas cheias de gente e ônibus lotado. Que se perde em alguns bares e se põe a ver a velocidade dessa gente. E rir da estupidez dessa lógica.

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